segunda-feira, 9 de abril de 2012

CONTO DE AMOR E PSIQUE, por Apuleio

Este livro não era suposto ter existido... refiro-me na minha prateleira. De facto, já faz um mês que o comprei e dirigia-me eu ao alfarrabista do costume quando, caindo em tentação como sempre em entrar na Fnac, o encontrei na secção de livros de bolsos. Como estava por uma módica quantia (semelhante ao que eu costumo pagar num alfarrabista) decidi aproveitar e levei-o comigo. Adiei o alfarrabista para outra altura...
De facto, este livro (ou parte dele) não se chama propriamente "Conto de Amor e Psique"... na verdade, este conto é um excerto de uma obra maior de Apuleio com onze volumes (!) chamada "O Burro de Ouro" e este conto só entra como narrativa encaixada. A obra (cujos onze volumes se encontram por sua vez agrupados em três secções) é sobre um jovem chamado Lúcio que, depois de tomar certa mezinha, se transforma em burro, vivendo aventuras e desventuras na sua nova forma. O "Conto de Amor e Psique" figura na segunda secção. Sendo Lúcio roubado por uns ladrões e levado para a sua caverna, lá conhece Cárite, uma jovem raptada no momento em que preparava os esposais estando, por isso, inconsolável. Assim, na tentativa de consolá-la e para a entreter, a criada dos ladrões conta-lhe uma história entre o filho de Afrodite e uma mortal.
O "Conto de Amor e Psique" é. decerto, uma história bem conhecida de todos, contudo raras vezes se nota toda a alegoria que existe entre a história e a existência humana. Efectivamente, Eros (que personifica a beleza de corpo) apaixona-se por Psique, uma mortal de beleza equivalente à de Afrodite (que simboliza a beleza de espírito) e que, mesmo sem nunca ter visto a forma física de Eros, apaixona-se à mesma por ele devido às suas atitudes (no fundo, o amor físico aliado o amor platónico ou, por assim dizer, o amor superficial aliado ao amor puro). Ambos têm, no fim, uma filha, à qual puseram o nome de Sensualidade. A união de Eros e Psique (que, casando, se tornam um só), bem como o aparecimento de Sensualidade, acabam por nos dar uma ideia do homem/mulher ideal: a beleza exterior aliada à beleza interior. É uma alegoria bem conseguida e neste conto (e isto é uma questão de gosto) só lhe encontro um defeito no argumento: à semelhança do amor falso e plastificado de Tristão e Isolda (convenhamos, não tem valor nenhum, ambos só se apaixonaram porque beberam uma poção, isso é bruxaria e não amor) também Psique, embora já se encontrando apaixonada por Eros, como dizer, se apaixona ainda mais por ele porque se picou sem querer numa das suas setas... Falo pessoalmente, essa parte tira a graça toda ao ideal que falei anteriormente e era um pormenorzinho que, sendo retirado, não interferiria em nada na história... a não ser que também tenha um simbolismo que me esteja a escapar, caso alguém tenha ideias avise-me, por favor.
Resumindo: quer tenhamos como motivação-base a leitura deste excerto o facto de estarmos apaixonados ou de apenas querermos racionalizar um bocado, o "Conto de Amor e Psique" surge como um documento que exprime o ideal da perfeição na vivência do sentimento comummente conhecido por Amor, podendo ser transportado, a meu ver, para todos os seus desdobramentos, sejam eles amor romântico, platónico, fraterno, sexual, familiar, etc.; porque, se nos dermos conta, em todos se verificar esta constante oposição Eros/Psique que tem a Sensualidade como seu produto. O que os torna diferentes são apenas as variáveis entre os conceitos. Infelizmente as almas são pobres e, com o passo dos anos, a Sensualidade (mesmo enquanto conceito usado no dia-a-dia) acabou por ficar órfã de mãe (Psique) e hoje é unicamente associada ao simbolismo de Eros... Pena...

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